REPARAÇÃO DE COMPONENTES (A 20ª de 30 importantes etapas) A Reparação de Componentes é a etapa mais exigente e aquela em que se acrescenta mais valor ao serviço prestado |
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Com
esta etapa dá-se início à Segunda Fase do processo de manutenção. O seu início
tem por pressuposto a aprovação do orçamento de inspecção e de reparação.
Em
simultâneo dá-se início à distribuição de sobressalentes para o início
das submontagens, procede-se ao envio dos acessórios para as oficinas subsidiárias
e iniciam-se as reparações e modificação de todos os componentes
classificados como "reparável" e "a modificar",
procedendo-se igualmente ao seu envio para outras entidades segundo um regime de
subcontratação, quando não existe uma determinada capacidade instalada.
As
Gamas de Reparação, entretanto, elaboradas são lançadas para a produção e
a sua calendarização é consolidada com os restantes trabalhos em execução,
referentes a outros motores pertencentes a outros clientes.
Esta
etapa é, sem qualquer margem para dúvidas, a mais longa e penalizante no âmbito
de todo o ciclo de manutenção dum motor.
A
variedade de componentes necessitando de intervenção é grande, fazendo
intervir diferentes tecnologias, numa sequência que pode atingir as 40 a 60
operações individuais, apenas para a reparação de um único componente. O prazo de execução destas reparações pode atingir,
para certos componentes e perante determinados defeitos, cerca de 60 dias de
calendário, o que é nitidamente superior ao prazo previsto para a realização
do programa de manutenção acordado por contrato, na esmagadora maioria dos
casos.
Este
facto só é ultrapassável por recurso a troca de componentes, no âmbito duma
prática denominada "pool" de reparáveis. Este conceito baseia-se na
existência duma subárea "volante" do armazém para onde são
dirigidos os componentes (identificados como críticos) após terem sido
reparados. Quando é necessário incorporar um componente crítico reparado,
remove-se um componente igual da "pool" de reparáveis para incorporação
no motor e o componente original deste inicia um longo ciclo de reparação que
no final culmina com o seu aumento à "pool", substituindo o
componente removido, num ciclo que se repete tantas vezes enquanto for praticável
esse tipo de reparação.
Esta
prática, enfrenta, contudo, algumas restrições, de entre as quais se destacam
as seguintes: o cliente não aceita que os componentes originais do seu motor
sejam trocados (com reflexos negativos no prazo de entrega); a troca de
componentes com TLV (tempo limite de vida) atribuído só poderá realizar-se
sem prejuízo do cliente (não se pode instalar um componente com um potencial
de funcionamento remanescente inferior ao que o componente original possuía); a
troca de componentes não se poderá efectuar entre peças com diferentes opções
incorporadas (por exemplo: o mesmo Número de Catálogo mas com diferentes
tratamentos anti-corrosivos) e a troca também não poderá efectuar-se se daí
resultar a incorporação de um componente com origem numa PMA e houver restrições
desse género por parte do proprietário (só aceita proveniência do OEM).
Existem,
espalhadas pelo mundo, muitas empresas classificadas como "reparadoras"
de motores cuja capacidade de reparação de componentes é praticamente nula,
reduzindo-se a sua actividade à inspecção, montagem e ensaio de motores,
subcontratando ou efectuando a troca comercial (na linguagem anglo-saxónica
designada por "exchange standard") dos componentes defeituosos.
A
prática de "exchange standard" é muito utilizada (embora sujeita a
restrições de preços e às mesmas restrições mencionadas para as trocas) e
baseia-se no envio, para reparação, dum componente, módulo, acessório ou
subparte, danificada e independentemente dos defeitos existentes (é condição
essencial que possa ser reparável e possua valor venal), para uma oficina
especializada, por troca com um produto igual ou equivalente (alternativo),
mediante o pagamento dum preço bastante inferior ao custo de novo mas
significativamente superior ao custo real da sua reparação.
Por
motivos económicos, a actividade de reparação apenas se justifica se fôr
possível repararem-se um número suficientemente grande de componentes, em série,
que viabilize esse negócio. Para cada tipo de componente e reparação, existe
um volume mínimo ("massa crítica") que viabiliza o retorno do
investimento, para o qual deverá ser possível atingir o ponto de viabilidade
("break even point") num prazo razoável com os critérios de
investimento.
Por
forma a optimizar-se a actividade de reparação é necessário processar-se
grandes volumes de componentes iguais ou idênticos em série, por forma a
minimizarem-se os custos de produção, eliminando tempos improdutivos devidos
à reconfiguração dos equipamentos e máquinas sempre que se inicia a reparação
de componentes de geometria e natureza diferentes. Segundo o mesmo raciocínio,
também a capacidade de engenharia deve ser orientada para problemas afins,
evitando o máximo possível a sua dispersão por um número elevado de
componentes diferentes.
A
actividade de reparação de componentes é aquela que consome maiores recursos
financeiros em investimento, é aquela que origina maior volume de investigação
e desenvolvimento e, portanto, contribui, sobremaneira, para a criação de
competências e para o fomento de transferência de tecnologia para o país e é
aquela que, simultaneamente, poderá permitir maiores receitas e valor
acrescentado.
Muitas
vezes uma capacidade de reparação altamente especializada é o ponto de
partida para uma actividade de fabricação de componentes, primeiro sob licença
e posteriormente catapultar a empresa para outros projectos.
A
reparação implica reabilitar os componentes, através da remoção dos
defeitos ou da reconstrução de áreas dos componentes diminuídas pelo uso ou
por incidentes. Em muitos casos os esquemas de reparação são descritos nos
manuais técnicos (normalmente apenas nos "Overhaul Manual" e
"Depot Maintenance") emitidos pelos fabricantes.
Para
as situações mais exigentes ou para aquelas em que, por razões comerciais o
fabricante prefere vender componentes novos e não está interessado em fomentar
o mercado de componentes reparados, há necessidade de as entidades
interessadas desenvolverem esquemas originais de reparação (à revelia dos
fabricantes mas sob o controlo das autoridades aeronáuticas), de que se tornam
proprietários (em exclusividade e com direitos de propriedade industrial).
Para
além deste tipo de reparações existe um vasto conjunto de esquemas de
recuperação elementares considerados como práticas correntes e que são do
domínio público e constituem-se como regras de arte, e que são efectuadas por
todos os reparadores detentores duma capacidade mínima.
No
entanto, o desenvolvimento dum esquema de reabilitação, independentemente da
massa crítica que possa constituir, só se justifica se o custo de reparação
for inferior a cerca de 40% a 60% do seu custo de novo. Este valor é designado
como limite de viabilidade económica de reparação e condiciona, para esses
componentes, a prática do "exchange standard".
Uma
das práticas correntes mais utilizadas é a reconstrução de roscas fêmeas
existentes em "carteres" e componentes semelhantes. Normalmente as
ligações dos "semi-carteres" e destes a outros acessórios e
subpartes, efectua-se através de pernos roscados nas duas pontas. Uma das
extremidades é introduzida no "carter" e a outra fica livre para ser
fixa através de porca ao outro componente. É frequente a rosca fêmea
(existente no corpo do "carter" de alojamento) danificar-se no acto de
desaperto dos componentes, após sucessivas desmontagens. A fim de se recuperar
o "carter" é usual a
utilização de uma peça postiça (designada na linguagem anglo-saxónica por
"insert") que se introduz na furação onde existia previamente a
rosca, agora danificada. É aberto um furo cego de maior diâmetro, introduz-se
a peça postiça por interferência (com aperto) e de seguida é aberta uma nova
rosca na peça postiça que irá alojar o perno. Nos motores de concepção
recente esta solução já vem integrada de origem. Uma outra solução
semelhante, consiste na colocação de uma manga metálica, entre a rosca e o
perno, suficientemente moldável, a fim de permitir refazer a rosca original.
Esta manga é designada segundo a linguagem anglo-saxónica por
"helicoil". Este é um exemplo de uma reparação tipo prática
corrente.
Uma
reparação extremamente simples usada na remoção de fissuras superficiais
pouco profundas, é o polimento dessa superfície. À custa da remoção de
material (se for considerado excedentário) consegue-se eliminar a fissura,
desde que não se prejudique a espessura local do componente nem se crie um
entalhe. Em muitos casos, no acto de inspecção quando esse tipo de fissuras é
identificado procede-se ao polimento da zona a fim de verificar se se trata de
fissuração pouco profunda. Se essa fissuração for removida o componente
passa de imediato à classificação "utilizável", caso contrário,
tem de ser usada uma metodologia mais elaborada para remoção da fissura.
A
reparação de fissuração superficial efectua-se por redução da profundidade
da fissura através da remoção local de material circundante ou através do
enchimento, por adição de material metálico (no estado líquido ou semi-líquido),
do vazio criado pela fissura. Lembra-se que o perigo associado a uma fissura é
a descontinuidade material que provoca. A mesma fissura pode ser tanto mais
perigosa consoante o local da geometria do componente em que se situa, devido a
um efeito de concentração de tensões nas peças. Uma fissura torna-se mais
perigosa se se situar numa esquina, num canto duma peça ou numa zona de
descontinuidade geométrica do que se situar numa parte plana da mesma.
A
reparação de fissuras subsuperficiais é mais complexa dependendo da
profundidade a que se encontra e da natureza e geometria locais do componente.
Pode usar-se a técnica de criar um entalhe e recobri-lo com enchimento por
soldadura. Em muitos casos o componente é rejeitado perante este tipo de
defeitos (usualmente resultam de poros ou "ocos" originados no
processo de fundição).
No
caso de componentes de parede muito fina apresentando grande concentração de
fissuras (muitas vezes trespassam a parede local de extremo a extremo) como
ocorre nas câmaras de combustão, o problema resolve-se cortando e removendo a
zona afectada e recolocando um remendo (na linguagem anglo-saxónica designado
por "patch") de material não fissurado, através de soldadura. Outras
vezes a deposição de um cordão de soldadura é suficiente. Todavia, neste
tipo de situações, dado tratar-se de componentes de parede muito fina deve
utilizar-se um processo de soldadura de baixa entrega térmica, de modo a
minimizar o sobreaquecimento localizado que, doutra forma, estaria a potenciar a
criação de outras fissuras, por deformação e fragilização local.
Outro
tipo de reparação bastante frequente é a recuperação dimensional das peças.
Este defeito, provocado por desgaste, retira material à peça, pelo que a sua
reparação passa pelo processo inverso de repor o material removido pelo
desgaste. Existem várias técnicas para repor material removido em superfícies.
Um dos métodos mais comuns é a projecção sobre a superfície a recuperar e a
alta velocidade de metal fundido. O metal de adição é fundido electricamente
num "canhão" e posteriormente arrastado por uma corrente eléctrica,
sob a forma de plasma, na direcção da superfície a recuperar. Nesta situação
é sempre depositado material em excesso (formando uma superfície bruta) e
posteriormente maquinado e rectificado para as dimensões originais da peça. O
material de adição tem uma composição química e resistência mecânica
muito próxima do material de base por forma a manter a homogeneidade física da
peça. A espessura da camada depositada depende de vários parâmetros mas pode
atingir cerca de 0.2 mm.
Outra
forma de depositar metal numa superfície desgastada é a via electroquímica.
Esta técnica é primariamente utilizada para depositar material de protecção
anti-corrosivo, mas pode ser usado para repor dimensões originais. A espessura
das camadas conseguidas por esta via é inferior ao processo de plasma. Por outro
lado, a técnica electroquímica implica que a superfície da peça seja usada
como um dos eléctrodos (positivo ou negativo) do circuito. A peça é mergulhada
num tanque contendo um banho essencialmente constituído pelo metal (ou mistura
de metais) a depositar. A peça é ligada ao eléctrodo positivo ou negativo,
consoante o processo, e o restante banho ao outro eléctrodo. Ao fazer-se passar
uma corrente eléctrica o metal é dirigido para a superfície a tratar e por
via electroquímica combinado com o metal de base.
Outra
forma tradicional de depositar metal noutra superfície é através de
soldadura.
Todos
estes processos envolvem várias tecnologias, de modo sequencial, desde as mais
avançadas até às mais tradicionais de maquinação através de tornos,
fresadoras, rectificadoras, tratamentos térmicos, etc.. Cada fase ou operação
tem que ser controlada, a fim de nos certificarmos que a mesma foi bem sucedida
ou atingiu os objectivos propostos. Existem algumas fases a que se devem suceder
outras complementares, com o único objectivo de eliminar efeitos secundários
causados por operações precedentes.
Por
exemplo, a soldadura normalmente endurece a zona soldada e áreas limítrofes,
através da formação de estruturas metalúrgicas mais duras e frágeis. Em
complemento aumenta localmente a concentração de tensões que poderá ser
prejudicial ao normal funcionamento dos componentes. Assim, há que minimizar
estes efeitos colaterais dum processo principal que foi a recuperação duma
superfície. Nessas circunstâncias as peças têm que se submeter a tratamentos
térmicos de alívio das tensões através do seu sobreaquecimento moderado e
controlado.
Alguns
processos electroquímicos implicam, igualmente, um tratamento térmico para
redução de efeitos secundários causados por aqueles.
Todavia,
durante a etapa de reparação efectuam-se muitas operações que não derivam
necessariamente de defeitos detectados. Existem operações que têm que ser
executadas por diferentes razões, tais como a reaplicação de pinturas, protecções
anticorrosivas ou protecções térmicas que foram removidas para permitir a
limpeza das superfícies, a modificação de componentes segundo instruções do
fabricante ou a reaplicação de tratamentos superficiais de modo a restabelecer
a resistência mecânica original e que foi diminuída pelas condições normais
de funcionamento do componente (como se trata da aplicação de grenalhagem (na
linguagem anglo-saxónica designa-se por "peening" com as variantes de
"shotpeening" e "vibropeening") que é uma variante da
martelagem e se destina a provocar um aumento localizado da resistência mecânica
através da criação de um estado triaxial de tensões de compressão).
Duma
forma mais geral, a reparação de componentes faz envolver múltiplas
tecnologias encadeadas em sequências lógicas e/ou convenientes, implicando um
"lay-out" oficinal adequado ao percurso que as peças têm que
realizar ao longo do seu ciclo de reparação.
O
estabelecimento do "lay-out" mais adequado e a estruturação da sequência
de operações mais optimizada, são fundamentais para a minimização dos
custos e tempos de execução (sobretudo dos tempos improdutivos de transição
entre postos de trabalho sequenciais, preparação e configuração de cada um
deles) e fazem envolver uma disciplina, de grande importância (algumas vezes
subvalorizada) designada por estudo de tempos e métodos.
Por
outro lado a quantidade e variedade de produtos químicos (alguns perigosos) que
são manuseados durante um processo de manutenção de motores aeronáuticos
exige um tratamento adequado dos efluentes originados a fim de poupar o ambiente
e cumprir as rigorosas normas de protecção ambiental em número e exigência
crescente.
Um
adequado departamento de aplicação de protecções anti-corrosivas por métodos
electroquímicos por si só e tendo em conta a ETAR (Estação de Tratamento de
Águas Residuais) que lhe é inerente, representa a maior parcela do orçamento
de exploração duma oficina de reparação de componentes aeronáuticos, só se
comparando com o departamento de tratamentos térmicos, pelo elevado consumo de
energia eléctrica, e o departamento de ensaios de motores, pela energia eléctrica
que consome e pela incorporação de instrumentação de medida que implica.
Estas três áreas são as maiores consumidoras de recursos, representando
eternos centros de prejuízo, quando avaliados na óptica de centros de custos e
resultados.
À medida que os componentes vão concluindo os respectivos ciclos de reparação ou se vai decidindo no sentido da troca de componentes considerados críticos, os componentes inicialmente classificados como "reparável" ou "a modificar" vão sendo reclassificados como "utilizável" e, por isso, fornecidos às áreas de montagem para continuação dos trabalhos.